Todos nós somos confrontados, diariamente, com grandes desafios e dilemas a que somos obrigados a reagir. Questionamo-nos se devemos seguir as normas comuns ou seguir os nossos instintos, se devemos responder ou desistir e se devemos compreender ou ripostar. Atribuímos, grande parte do tempo, inconscientemente, valor a este tipo de conflitos internos. Isto acontece porque o ato de nos confrontarmos com este tipo de conflitos e o de os superar é associado a grandeza e a conquista.
Encarar desafios
Normalmente, encaramos os desafios com uma perspetiva errada, isto quer dizer que os entendemos e interpretamos consoante o que não é propriamente verdade. Aquilo que assumimos como um grande problema, na verdade não é o que pensamos ser. As mesmas características que parecem dar-lhe força são, frequentemente, o caminho para a resolução.
Outro ponto importante na forma como interpretamos os desafios, é o facto de estes nos poderem favorecer, ao contrário daquilo que pensamos. Assim sendo, estes problemas podem abrir portas, criar oportunidades e tornar tudo possível, o que, de outro modo, poderia parecer impensável e impossível de alcançar.
Para alcançarmos a solução e desconstruirmos o problema, precisamos de encontrar melhores orientações para enfrentar todo o processo.
Para explicar o tema, apresento um exemplo prático.
David e Golias
Conhece o confronto épico entre David e Golias? Sim? Perfeito! Não? Vai passar a conhecer aqui.
Resumidamente, duas civilizações (israelitas e filisteus) tencionavam combater com o objetivo de conquistar a cadeia montanhosa junto a Belém. No entanto, nenhum dos exércitos decidiu avançar para a guerra real. Até ao momento em que os filisteus decidiram enviar o seu guerreiro mais poderoso, Golias, para um combate corpo a corpo, que decidiria quem seria o vencedor.
Nenhum israelita, no seu perfeito juízo, quereria enfrentar aquele gigante, a não ser o jovem David. David era um pastor de estatura baixa, que nunca tinha combatido na vida. Ainda assim, decidiu combater o armado e composto Golias com uma sacola e algumas pedras, recusando todas as armaduras e armas sugeridas pelo exército. O que acontece realmente é que, para além de pastor, David também era caçador, o que o tornava num lançador de excelência.
Todos nós sabemos como termina a história, David vence Golias, lançando-lhe uma pedra diretamente à cabeça. Moral da história: o pequeno vence o grande, ou até, o fraco vence o forte, milagrosamente. Acaba por ser uma metáfora para as vitórias improváveis. O problema desta metáfora é que é interpretada de forma errada, isto porque assume que existe sempre um lado mais débil, que existe uma vitória improvável. Vamos, então, reformular a situação ponto a ponto:
1 – Um lançador da época conseguia ferir gravemente qualquer animal a 180 metros de distância;
2 – Segundo referência bíblica, Golias assume que o combate vai ser corpo a corpo, dizendo: “vem até mim”;
3 – Todos os israelitas pensam saber quem é Golias, devido às histórias que vão ouvindo. Ou seja, avaliam-no e tiram conclusões precipitadas;
4 – Golias revela não ser bem aquilo que se pensava e David apercebe-se. Golias desceu o vale acompanhado por um escudeiro. No entanto, os escudeiros apenas acompanham os arqueiros, porque estes são os únicos que precisam de proteção;
5 – Golias afirma: “Serei eu um cão, para que venhas a mim com paus?” O que acontece é que David tinha apenas um pau consigo. Suspeita-se que Golias sofresse de acromegalia, um tumor que provoca uma produção excessiva de hormonas de crescimento, o que acaba por justificar o seu tamanho para a época. Para além disso, normalmente, esta doença faz-se acompanhar de problemas de visão, o que ajuda a perceber a dificuldade de Golias nas duas afirmações aqui mencionadas. O que permitia a Golias ser tão grande e parecer tão poderoso era, na verdade, a sua maior fraqueza.
Sim, efetivamente, David vence Golias, no entanto, segundo Robert Dohrenwend: “Golias tinha tantas hipóteses contra David, como qualquer guerreiro da Idade do Bronze armado com uma espada contra uma pistola automática.”
Através deste exemplo, é mais simples perceber que o tamanho do desafio ou da adversidade depende apenas da forma como o encaramos. Os fortes e os poderosos nem sempre são aquilo que aparentam.
David foi levado pela sua coragem e fé. O que é que nos pode levar?